4 de janeiro de 2013

Chuvas e tragédias no Rio de Janeiro: problema ambiental, irresponsabilidade populacional ou descaso político?


Está oficialmente aberta a temporada de chuvas no Rio de Janeiro, e com ela infelizmente também se abre a temporada de deslizamentos, enchentes e mortes. O verão mal começou e já trouxe a primeira enxurrada, deixando um rastro de destruição nos municípios de Duque de Caxias, Angra dos Reis e alguns outros na Região Serrana do Rio. Até agora, os números oficiais da Defesa Civil são de um morto, oito desaparecidos, 1.262 desalojados e mais de 2 mil evacuados. Contudo, certamente esses números estão subestimados e infelizmente vão aumentar ao longo dos dias. No verão de 2011 o problema foi ainda mais grave, onde mais de 900 pessoas morreram em uma tragédia que arruinou a cidade de Nova Friburgo. Em 2010 a bola da vez foi o Morro do Bumba, em Niterói, deixando mais de 260 mortos por soterramento. Ainda existem dezenas de exemplos como esse, e eu torço muito para que esses episódios não se repitam, mas sinceramente, analisando o histórico ambiental e os esforços políticos atuais a possibilidade de repetição é alta.

Para entender o porquê dessas tragédias no Rio temos que identificar a raiz do problema, então vamos lá: (1) A geografia do Rio de Janeiro é formada por terrenos naturalmente acidentados (inclinados), encostas íngremes e clima tipicamente tropical, com grande pluviosidade; (2) retirada da cobertura florestal das áreas inclinadas, facilitando a infiltração de água no solo acima da capacidade de absorção; (3) urbanização desordenada que leva a uma ocupação de risco em encostas, sendo isso resultante do crescimento demográfico excessivo; e (4) ausência de um sistema de escoamento de esgoto e coleta de lixo eficaz. Como podemos ver, das quatro razões para o acontecimento de tragédias, três são causadas pela irresponsabilidade humana. Não podemos culpar a geografia fluminense. Mas então de quem é a culpa, da população que ocupa encostas ou do governo que não vê? Dos dois, mas não de forma igualitária.

Conversando com a amiga Carolina Dumard, moradora de Petrópolis, na Região Serrana do Rio, ela me informou que esse ano as chuvas já causaram deslizamentos, soterramentos de casas, mas nenhum ferido (por sorte). Ao perguntar sobre o que a prefeitura estava fazendo, a resposta dela foi: “Aqui em Petrópolis tem um sistema de sirenes para avisar a população que vive em áreas de risco para sair de suas casas. Não é a solução, mas poupa vidas”. E ela continuou “Foram feitas mais de 20 obras de contenção de encostas. A defesa civil ta se mostrando presente e prestativa. Existe um bom sistema de escoamento, mas que acaba sendo muito prejudicado pela própria população que não descarta o lixo corretamente. Mas desde a última tragédia nem uma casa popular foi entregue”. Foi tanta informação que terei que esmiuçar.

Um sistema de sirenes é realmente importante, mas não substitui a ação direta do poder público sobre a população que vive nessas áreas. Parte do problema seria resolvido com a retirada dessas pessoas, que deveriam ser realocadas para casas populares em áreas seguras. Mas o problema só não se repetiria se houvessem três ações primordiais. A primeira é o reflorestamento das encostas desmatadas; a segunda seria a intensa fiscalização e coibição de novas ocupações em encostas; e por fim, uma ação de educação ambiental real, que instruísse a população que vive em áreas de risco a serem mais responsáveis com o descarte de seu lixo. A parte difícil é a remoção das pessoas. Difícil, mas não impossível. Já as outras três medidas são relativamente baratas e de fácil aplicação, e em teoria já estão dentro do orçamento e da agenda ambiental de muitos municípios fluminenses. Se isso não está sendo feito, não vejo outro motivo que não seja pilantragem política.

É claro que nessa questão entram muitas variáveis problemáticas, como o insustentável crescimento populacional, ou como dito pela própria Carolina “Não há mais espaço que possa ser seguramente habitado em Petrópolis”, mas ainda assim é plenamente possível que seja encontrada uma solução a curto e médio prazo, desde que haja comprometimento para isto. O cenário atual é gravíssimo, mas a solução é simples. 

Já temos casos de tragédias causadas pela ação humana suficientemente documentados ao longo dos séculos (vide o colapso dos Rapanui da Ilha de Páscoa), mas parece que estamos longe de aprender. O exemplo das tragédias do Rio de Janeiro são apenas mais um forte exemplo das consequências do desmatamento e crescimento demográfico descontrolado em nossa sociedade. Ao invés aproveitarmos a oportunidade para aprender a lidar com a esses problemas, e tentar repensar nossas ações no planeta, estamos apenas assistindo incólumes a essas crises ambientais que trazem dor e sofrimento para a nossa sociedade, sobretudo aos mais pobres. Assistimos a apatia do governo que covardemente se abstém de qualquer responsabilidade, como se o soterramento de famílias inteiras fosse algo natural e irremediável (ou seria proposital?). Quantas civilizações ainda precisam ruir e quanto sofrimento precisaremos sentir para percebermos que precisamos fazer alguma coisa?

E para a turma antiecologia de plantão, percebam que não estou falando de plantinhas ou bichinhos, estou falando dos teus filhos e da qualidade de vida deles.


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