Depois do desastre chamado Belo Monte, aos poucos o governo brasileiro
começa a preparar terreno para outro desastre, considerando a construção de um conjunto
de hidrelétricas no rio Tapajós, na Amazônia. A bacia hidrográfica do rio Tapajós
é globalmente considerada o maior complexo de biodiversidade do planeta e é
protegido por doze Unidades de Conservação (UCs), incluindo o Parque Nacional
da Amazônia, que juntas formam o maior mosaico de áreas naturais protegidas da
Terra.
Eis uma pergunta que deve ter ficado no ar: Se o Tapajós é protegido
por Unidades de Conservação integrais, como querem construir algumas
hidrelétricas nele? A resposta é assombrosa. Em janeiro desse ano a nossa
presidente da república Dilma Roussef editou a Medida Provisória (MP) n° 558,
que exclui vastas áreas de Unidades de Conservação na Amazônia para abrigar
canteiros de obras e reservatórios de grandes hidrelétricas, sem estudos
técnicos e qualquer consulta às populações afetadas e à sociedade brasileira em
geral. Em junho o Senado Federal converteu essa MP na Lei 12.678, de 25 de
junho de 2012. Trocando em miúdos, o governo federal diminuiu as UCs para dar
lugar ao seu atual modelo desenvolvimentista irracional, e tudo na surdina.
Quando perguntado sobre isso, o presidente do ICMBio – órgão federal
responsável pela gestão das UCs e conservação da biodiversidade - Roberto
Ricardo Vizentin disse: “Há uma decisão
estratégica de desenvolvimento do país e o potencial para gerar a energia capaz
de atender essa demanda está localizado em áreas de proteção integral. Para
permitir a realização dos estudos, a área tinha que ser desafetada. É uma
questão lógica.”
Só para ter uma breve ideia dos danos. A construção de apenas uma das
barragens do Tapajós irá inundar uma área de 1.368 km² de floresta amazônica
primária, uma área quase do tamanho da cidade de São Paulo, equivalente a duas
vezes e meia a inundação que será causada pela hidrelétrica de Belo Monte. Além
do óbvio dano a biodiversidade (por sinal, de inigualável expressão), o enchimento
irá afetar negativamente as populações indígenas e ribeirinhas que dependem do
Tapajós para sobreviver. Tal absurdo levou a sociedade civil a organizar um
movimento de defesa chamado Tapajós Vivo.
O que a gente vê é mais uma ação absurdamente irresponsável e
inconsequente advinda de um governo desenvolvimentista que mantém sua principal
matriz energética baseada em um método caro, ambientalmente insustentável e
arcaico, eu já falei sobre isso aqui nesse blog em outro texto. Mas o pior de
tudo é que o governo está se baseando em projetos utópicos e agindo por baixo
dos panos, sem participação da sociedade e usando argumentos mentirosos para
ludibriar aqueles que se levantam contra. Durante o debate de conversão da MP
em Lei, a relatora que defendeu a proposta do governo foi a senadora Vanessa
Grazziotin (PCdoB - AM). Segundo ela, a decisão foi para “assegurar uma matriz energética nacional limpa e garantir o
desenvolvimento sustentável do país e o bem-estar da população”. Sou só eu,
ou mais alguém aqui sabe que a hidrelétrica de Tapajós, assim como Belo Monte,
Jirau e Santo Antônio, Telles Pires, Araguaia, etc., é exatamente o oposto do
que disse a senadora?
Para criar um clima ainda mais fúnebre dentro do atual cenário de
políticas públicas, além da Lei 12.678, no altar de sacrifícios ambientais
temos a reforma do Código Florestal, a Portaria 303, a PEC 215, Lei Complementar nº 140, entre outros
absurdos. Para ler mais sobre as perigosas ações governamentais e as consequências
desse empreendimento, clique aqui.
Enfim, eu não quero parecer alarmista e nem quero ser sensacionalista,
mas acho extremamente preocupante todas essas atitudes vindas da cúpula que
governa esse país. No ponto de vista biológico e social condeno veementemente a
matriz energética brasileira baseada em hidrelétricas. Já no ponto de vista
sociopolítico é preocupante que o governo esteja agindo como uma máquina
independente, com decisões tomadas no escuro, sem participação e consulta
popular, de forma irresponsável e que provavelmente está manipulando a mídia,
já que notícias contrárias às intenções do governo não se vê. Para você, caro
eleitor, contribuinte e cidadão brasileiro, que achava que Belo Monte era uma
iniciativa que embora perigosa fosse isolada, vos anuncio que esse pode ser
apenas o início do fim.
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