28 de março de 2011

Voltando ao começo: uma viagem pra aprender a viver



Você já percebeu que a cada ano que passa os dias parecem mais curtos? Já percebeu que quase não temos tempo pra nada?

Essa última semana que passei aqui no Piauí foi como uma viagem na máquina do tempo. Tive o privilégio de passar parte dos meus dias ao lado de pessoas que vivem felizes, trabalham, aproveitam a vida e ainda sobra um cadinho de luz do dia pra ficar de prosa na varanda e tomando um gostoso café fresco. Quantos de nós nas urbes de todo o Brasil podemos fazer isso? Esses dias aqui me fizeram refletir sobre algumas questões sobre os hábitos de consumo de nossa espécie. Não é novidade que o consumismo excessivo vem sendo tratado como um grande problema ambiental nas últimas décadas, mas se pararmos para analisar, o consumismo também pode ser um problema social, diferente do que se pensa, afetando inclusive o nosso aproveitamento do tempo. Atualmente as pessoas vivem envoltas em um universo cheio de coisas novas. Todo dia são inventados produtos milagrosos indispensáveis ao nosso dia-a-dia e que temos quer ter. Quantas vezes você não passou em frente a uma vitrine e se perguntou “Nossa, como eu pude viver sem isso até agora?”. Esse pensamento alimenta um ciclo que leva as pessoas de classes sociais mais baixas a desejarem ter o mesmo que as pessoas mais ricas têm. E também leva os mais ricos a sempre querer mais para suprir algumas carências.

Existe uma ligação direta entre tudo isso que eu disse. Perceba, as pessoas precisam trabalhar cada vez mais para poder consumir cada vez mais e manter o padrão social esperado. E no final das contas, a principal atividade de lazer dessas pessoas é ir ao shopping para comprar, visto que elas nem tem muito tempo pra aproveitar o dinheiro mesmo. O consumismo acaba funcionando como uma válvula de escape para nossa deficiência de diversão.

Uma vez assisti a uma palestra do ótimo pesquisador Ricardo Iglesias, da UFRJ, que explanava sobre o que ele chamou de ócio criativo. Quando as pessoas trabalham menos, tem mais tempo para se divertir, para relaxar e para pensar, consequentemente acabam sendo mais criativas e produzindo mais, seja na ciência, na indústria, no comércio... Não importa. E há quem pense que se reduzirmos o consumo aumentaríamos o desemprego, já que as indústrias trabalham com menos funcionários. Não, isso é contraditório. Pense nesse exemplo simples: 

Vamos supor uma empresa industrial que possua 100 funcionários trabalhando oito horas por dia em alta produção industrial, caso houvesse uma redução no consumo de seus produtos, obviamente a produção também reduziria, mas sem demissões e com possíveis vantagens para a empresa. Ao invés da redução de funcionários, o ideal seria a redução da carga horária de trabalho, ou seja, 100 funcionários trabalhando cinco horas por dia, com redução proporcional do salário, logicamente. A empresa também economizaria na aquisição e transporte de matéria-prima industrial, que atualmente pode corresponder até 18% do custo total das indústrias brasileiras. Com uma redução de três horas na carga de trabalho diário, haveria uma redução de aproximadamente 38% no consumo de energia elétrica e água, recursos extremamente caros hoje em dia. Agora vamos ao outro lado. Não pense que a redução do salário seria algo prejudicial ao trabalhador. A pessoa trabalhando menos ganha menos, mas tem mais tempo para aproveitar a vida. Além disso, com a redução do consumo social essas pessoas não tem tanta necessidade de gastar com amenidades. E não paramos por aí. O consumismo é um ciclo prejudicial e responsável por diversas paranóias urbanas. As pessoas estão se enclausurando em seus castelos de mármore, interagindo pouco e com medo uns dos outros. Esse desejo de consumo pode ser um dos motivos que aumentam o índice de criminalidade nas áreas urbanas. Afinal, tudo é baseado na vontade de ter, de consumir. As crianças hoje em dia já crescem com traumas, com medos e travas que afetam seu desenvolvimento social e prejudicam sua formação como adultos capazes de lidar com o meio que vivem. E isso pode ser uma consequência da falta de tempo para educar e orientar devido ao exagerado tempo de trabalho que temos que ter para ganharmos um dinheiro que temos que gastar para suprir a nossa falta de tempo. Parece ridículo, mas é bem real. 

Por isso, não me surpreendo mais quando venho para lugares como esse lindo Piauí e encontro pessoas educadas, de boa índole e bem dispostas a lhe ajudar e conversar sobre o que tiver que ser. Essas pessoas não tiveram a educação formal das urbes e bem menos dinheiro, mas tiveram tempo. Essas pessoas tem poucas coisas mas as suas vidas ainda os pertencem!







São João do Piauí, PI, Brasil.
Março de 2011

Mais do que um agradecimento, essa fotografia é uma homenagem ao companheiro Sebastião Luís de Macedo e sua família que nos acolheram com muito carinho e amizade enquanto trabalhava no Piauí. Aos meus companheiros de pesquisa, Ana Cláudia Delciellos e Rafael Laurindo, fica o meu agradecimento pessoal por compartilhar desses momentos com alegria.


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