3 de fevereiro de 2011

Sobre a cegueira, a surdez e qualquer outro problema ambiental

Vou confessar que não sou uma das pessoas mais sociáveis que existe. Divido meu tempo entre as atividades de pesquisa no laboratório, nos estudos de campo com ecologia de mamíferos, nas aulas da faculdade, nos trabalhos que escrevo no computador de casa, e logicamente eu tenho família e namorada, e preciso me dedicar a eles também... Mas às vezes, quando estou transitando de ônibus entre um local e outro eu gosto de observar o mundo em volta, olhar a paisagem com cuidado, conhecer mais sobre a vida de pessoas que não conheço e provavelmente jamais as verei novamente... Hoje, por exemplo, eu fiz isso e cheguei a seguinte contestação: os piores problemas ambientais que existem não são a fragmentação ou destruição de hábitats, a poluição aquática excessiva ou as emissões cavalares de carbono na atmosfera. Os piores problemas ambientais são a cegueira, a surdez e a mudez. Porque não é possível que uma pessoa com mínimo senso crítico e que ande pelas ruas de qualquer grande centro urbano, como Rio, não perceba que as coisas não estão indo bem.

Os surdos não escutam o barulho enlouquecedor gerado pelas buzinas dos carros em um trânsito lento. Eles não sentem falta de ouvir sons diferentes dos habituais motores e vozes humanas. Os surdos não sentem a falta de ouvir a voz de alguns de seus parentes, como as aves, os morcegos, os macacos. Eles não escutam, logo, não compreendem que aquilo não é normal e que estamos vivenciando alguma coisa diferente do que nossos genes dizem que devemos viver. Mas tudo bem, não é culpa deles serem surdos.

Os cegos não vêem que o horizonte tem uma cor pálida, embaçada. Eles não vêem que a maior parte dos morros e serras que o cercam ou tem uma série de casas humildes empilhadas ou tem uma coloração fosca e uniforme. Os cegos não percebem que esses morros estão estáticos e vazios, sem vida e futuro. Os cegos não vêem a fumaça dos veículos e das indústrias. Mas ninguém quer ser cego, não é culpa deles.

Os mudos são os piores, tadinhos. Eles vêem os problemas, enxergam a magnitude e alcance de seus atos e de seus irmãos. Os mudos escutam os barulhos paranóicos de uma cidade grande, entendem o caos de uma sociedade próxima ao colápso. Os mudos percebem tudo o que está acontecendo, muitos sabem até o que fazer pra resolver. Mas coitadinhos dos mudos. Eles não podem falar, não podem contar pras pessoas o que vêem e escutam. Não podem transmitir seus conhecimentos pras novas gerações. Uma pena!

Tenho pra mim que ser cego, surdo e mudo seja até bom. Eles não compreendem e não sofrem. Não passam a vida pesquisando ecologia, estudando matemática, transmitindo conhecimento pras pessoas e escrevendo em um blog como mais uma tentativa de mostrar pra quem queira ler que precisamos mudar nossa estratégia de vida!

Essa é uma boa tática de pilantragem social.

Políticos surdos, população cega e ecologistas mudos!

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